Era Jesus a quem eu procurava


 

De algum modo era Jesus a quem eu procurava. 

Na infância, ele era o que tornava Deus inteligível. Estudávamos os mais diversos temas espíritas como grandes atributos do universo humano, e as evangelizadoras desenhavam Jesus ali como a nos proteger, no planeta Terra, dos asteróides que vez ou outra ameaçavam a existência de toda a humanidade.

Na adolescência, decidi estudar as obras pilares do espiritismo, e qualquer lei só fazia sentido quando corporificadas nele. Quando me deslumbrei com o romance "Nosso Lar" de André Luis/Chico Xavier, o mundo espiritual passou a ser quase palpável, mas eu não me apercebi de algo: Jesus não estava lá. Aceitei como um cachorro aceita que seu dono está em viagem, e o caminho é longo e áspero até alcançá-lo. O dogma espírita de que há uma longa marcha até merecermos estar com Jesus lado a lado me parecia razoável. Por que um espírito de altíssima envergadura, cuja estatura moral é incalculável, haveria de me ter ao lado?

Deixei passar que a essência de sua vida foi estar ladeado de homens, molhar-se em útero de mulher, ajudar o pai na carpintaria, interpretar as escrituras entre jovens e sábios, tocar os pés nas águas junto aos pescadores, melar-se de peixes, sujar suas mãos com o levedo dos pães, tudo para alimentar cinco mil que o seguiam. E ainda, deixar ir a si as criancinhas.

Não sou eu que devo merecer estar ao seu lado, é ele que me quer. 

Por que simplesmente não aceito, me calo, e sigo minha vida nunca perdendo a eucaristia dos domingos? Porque ele não está de fato presente aos meus sentidos. Tudo é metáfora até o dia em que o encontrar. Ainda será aqui? Virá ao meu Damasco? Ou será apenas quando eu cerrar os olhos?

Até lá vou continuar procurando seguindo os ecos da igreja que ele deixou. As imperfeitas reverberações de suas palavras, ora amplificadas por santos ora esmaecidas por protocolares imitações.

Assim, como você veio a mim um dia, aqui estou eu em busca de encontrar Você.

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