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Mostrando postagens de julho, 2024

Minha esposa

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Eu lembro que tentei doutriná-la, converter é a palavra mais certa. Não querendo viver o primeiro namoro em que tive a amada rejeitando minha doutrina, dei para apostar na minha última namorada com a vontade de moldá-la à minha felicidade. A fragilidade dela me passava uma abertura para tentar domesticar o seu medo, sua vergonha, sua tristeza, e fazer florir ainda mais o seu sorriso, deixá-la plena, livre, mulher. Queria fecundá-la muito mais do que com meus genes, mas com minha filosofia, a espírita.  Não consegui. O tempo foi passando e ela resistia. Não com silogismos. Apenas resistia. Embora cada vez mais distante da missa e sempre afeita a um catolicismo mais aberto, ela resistia. Havia um núcleo de crença inabalável que eu pelejava por entrar e ressignificar, mas via que permanecia.  - Jesus e Deus são uma só e a mesma pessoa.  Jesus fazer milagres improváveis e ter ressurgido dos mortos com o corpo de carne, ou ainda a virgindade de Maria, tudo era consequência desse dogma prime

Entre o Amor e a Revolução

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Judas, com um beijo entregas este Homem? (Lucas 22:48)   Havia um amigo com quem partilhava a caminhada de volta para casa, vindo do colégio, todos os dias. Éramos, àquela época, moços e ingênuos.  Lembro, em meio ao carnaval que animava as ruas da cidade, de ele me pedir que o acompanhasse até o lugar onde sua namorada estaria lhe esperando. Fomos até lá e esperei a alguns metros de distância ele ter uma conversa com ela. Acabaram o namoro ali. Ela era jovem, dizia, estava cheia de desejo, e não queria se prender a apenas um rapaz. Como eu havia dito antes, era carnaval. Ele me agradeceu a companhia. Voltou desolado para o lugar em que estávamos originalmente, sem dança, sem alegria, apenas olhava o movimento dos foliões, disfarçando a dor o resto da noite. Separamo-nos. Ele, rumo à advocacia, e eu, à medicina. Um dia, fui visitá-lo. Ainda estávamos na faculdade. Sua mãe era religiosa. E ele havia herdado certo hábito da mãe de ir à igreja. Pelo menos, naqueles idos de nossa adolescên

Era Jesus a quem eu procurava

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  De algum modo era Jesus a quem eu procurava.  Na infância, ele era o que tornava Deus inteligível. Estudávamos os mais diversos temas espíritas como grandes atributos do universo humano, e as evangelizadoras desenhavam Jesus ali como a nos proteger, no planeta Terra, dos asteróides que vez ou outra ameaçavam a existência de toda a humanidade. Na adolescência, decidi estudar as obras pilares do espiritismo, e qualquer lei só fazia sentido quando corporificadas nele. Quando me deslumbrei com o romance "Nosso Lar" de André Luis/Chico Xavier, o mundo espiritual passou a ser quase palpável, mas eu não me apercebi de algo: Jesus não estava lá. Aceitei como um cachorro aceita que seu dono está em viagem, e o caminho é longo e áspero até alcançá-lo. O dogma espírita de que há uma longa marcha até merecermos estar com Jesus lado a lado me parecia razoável. Por que um espírito de altíssima envergadura, cuja estatura moral é incalculável, haveria de me ter ao lado? Deixei passar que a